O Biometano como indutor da Descarbonização da Indústria e da Economia Circular

O Biometano como indutor da Descarbonização da Indústria e da Economia Circular

A sustentabilidade é, já hoje, um dos mais relevantes fatores de competitividade na generalidade dos mercados.

Por Nuno Delgado Pinto
Membro da Comissão Executiva e Responsável pelo Biometano, REGA Energy


A imperiosa urgência de uma transição energética, suscitada pela emergência climática aliada aos brutais impactos no setor energético resultantes da invasão da Ucrânia pela Federação Russa, colocou a descarbonização da economia no topo da agenda das políticas públicas europeias e norte-americanas suportadas e induzidas pela crescente pressão das opiniões públicas, com especial incidência nas camadas mais jovens da população.

O tema da sustentabilidade nos seus três pilares, ambiental económico e social, é hoje também incontornável em qualquer estratégia empresarial, pois assim o exigem todos os agentes ao longo das cadeias de valor, com especial destaque para os clientes finais e, em cada vez maior medida, os financiadores.

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O biometano é a solução mais rápida e eficaz de assegurar objetivos de descarbonização da indústria.

Os setores industriais, e em especial, os setores de maior intensidade energética por via da necessidade de elevadas temperaturas nos seus processos (e, por tal, grandes consumidores de gás natural fóssil), enfrentam a urgência de implementarem uma efetiva política de descarbonização substituindo o gás natural por soluções alternativas e promotoras de uma efetiva redução das suas emissões de CO2.

O biometano será em Portugal, à semelhança do que já acontece em muitos países europeus, o primeiro dos atores no processo de descarbonização das indústrias “hard-to-abate”. Esta primazia decorre de tratar-se de um gás 100% renovável, ser um substituto perfeito do gás natural com uma percentagem de CH4 equivalente e, por tal, poder ser transportado e distribuído pela rede de gás natural sem qualquer limitação e, de igual modo, ser consumido pela indústria sem necessidade de adaptação dos seus processos, o mesmo é dizer sem implicar investimentos adicionais.

O exemplo da Dinamarca

O exemplo da Dinamarca é paradigmático, em 2022 o biometano representou cerca de 30% do gás em circulação na rede dinamarquesa de gás, percentagem que em 2023 atingirá os 40%, num percurso para a total descarbonização dessa rede em 2030.

A escassez a prazo (por via das limitações da matéria-prima), face à procura potencial apresenta-se como, talvez, a única razão para o biometano não poder ser eleito como a solução para a descarbonização total da indústria e dos restantes setores consumidores de gás natural. No entanto não restam dúvidas que o biometano apresenta-se, desde já, como a solução mais rápida e menos onerosa para a substituição do gás natural, após esgotada toda a capacidade de eletrificação dos processos.

A sua tecnologia, tanto ao nível dos digestores anaeróbios para a matéria orgânica como na componente de purificação em biometano do biogás gerado na digestão são tecnologias absolutamente maduras e a operar em escala industrial por toda a Europa, com mais de 1500 unidades em operação e um crescimento anual de cerca de 20%. Estamos assim perante uma solução “ready-to-go”.

O biometano usa como fonte primária de energia os bioresíduos, os quais a par do sol e do vento constituem a tríade de fontes renováveis passíveis de descarbonizar o planeta. Sendo que o biometano se distingue pela sua não intermitência.

Estamos perante um gás renovável com garantia de origem e prova de sustentabilidade a qual em função da origem da matéria orgânica poderá ter um balanço carbónico neutro ou mesmo negativo.

Do exposto resulta que o biometano é a solução mais rápida e eficaz de assegurar objetivos de descarbonização da indústria mitigando, ou mesmo anulando nos casos de substituição total, os riscos associados ao expectável aumento dos custos com as licenças de carbono.

O biometano utiliza como matéria-prima biomassa animal e vegetal (restos alimentares, desperdícios agrícolas ou efluentes pecuários), impede que o metano (21 vezes mais poderoso que o dióxido de carbono como gás de efeito de estufa) seja emitido para a atmosfera, produz um gás renovável e um fertilizante/bioestimulante para uso agrícola.

Valorização de resíduos orgânicos

Na prática, a produção de biometano promove um adequado encaminhamento e valorização dos resíduos orgânicos, minimizando os seus impactos no ar, no solo e na água, extraindo o seu potencial energético e produzindo um digerido higienizado, rico em nutrientes e matéria orgânica, que é devolvido ao solo e utilizado como fertilizante agrícola.

A produção deste gás renovável é também indutora de ganhos ambientais indiscutíveis: nas explorações agrícolas, agropecuárias e agroindustriais, por via do adequado tratamento dos resíduos e efluentes gerados e da redução da utilização de fertilizantes químicos.

As unidades de produção de biometano tratam assim dois: o do gás, tanto por via da redução efetiva de emissões de gases com efeito de estufa como pela da produção de um gás renovável e o dos nutrientes recuperando-os e devolvendo-os ao solo.

Os ganhos sociais são também de enorme importância promovendo, simultaneamente, a dinamização do espaço rural onde a maioria destes resíduos são produzidos (e tantas vezes incorretamente tratados), gerando empregos e fixando populações em algumas das zonas demograficamente mais deprimidas, contribuindo para uma maior coesão territorial e social do país.

No enquadramento das políticas da União Europeia, o biometano é hoje interpretado como a via rápida para descarbonização da indústria e mesmo como um promotor da reindustrialização da Europa por tratar-se de um recurso endógeno) que reforça a segurança energética da Europa, reduzindo importações e a dependência da Rússia e de outras geografias potencialmente instáveis.

Estamos perante um exemplo indiscutível de economia circular promotora da sustentabilidade da região em que cada um dos projetos se insere e do planeta por via da redução global de emissões.

A aposta no biometano corporiza o princípio de pensar globalmente e agir localmente.